
Em 1968, a cidade paranaense de Londrina entrou no mapa cultural do país com o festival internacional de teatro Filo. Em 1973, a cidade serrana de Gramado, na Serra Gaúcha, sediou a primeira edição do festival de cinema que, até hoje, é o mais importante do Brasil. A Flip definiu, porém, um novo patamar de evento cultural e tornou-se o mais relevante deles. Ela trouxe três conquistas básicas, que até hoje enchem os olhos de prefeituras e agitadores culturais: elevou a qualidade do turismo, trouxe ganhos materiais e imateriais e colocou a cidade em lugar de destaque no calendário cultural. O resultado? O jeito da Flip de fazer evento cultural se tornou inspiração para novos e antigos festivais de música, cinema, teatro, dança, gastronomia e, principalmente, de literatura (leia o quadro abaixo). Hoje são centenas as cidades brasileiras que buscam a transformação por meio da cultura. Elas disputam quem faz o melhor festival na área que escolheram – e isso se tornou uma característica marcante da cultura do país. O Brasil, sem exagero, se tornou o país dos festivais.
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A principal inovação da Flip em relação aos demais foi estreitar a proximidade dos palestrantes com o público. Isolados nas ruas de pedra do Centro Histórico, fãs e celebridades caminham juntos, bebem juntos, vão às mesmas festas. Depois da Flip, todos os festivais tiveram de copiar essas características para tentar os mesmos resultados. O Fórum das Letras, de Ouro Preto, criado em 2005, é praticamente uma cópia da Flip em território mineiro, com palestras e festas pela cidade. No Garanhuns Jazz Festival, em Pernambuco, além de shows de jazz, os artistas têm contato com o público em palestras e oficinas de música. O Festival Internacional de Dança de Cabo Frio junta a cultura erudita do balé num cenário descontraído de praia.

Outro efeito imediato são o aumento e a qualificação do turismo. O nome do Festival Literário da Pipa, a Flipipa, revela a inspiração na festa de Paraty. Pipa se localiza em Tibau do Sul, no Rio Grande do Norte. Lá, uma fundação particular buscou patrocínio federal para realizar a primeira edição de seu festival literário em 2009. Como a praia que dá nome ao festival é uma das mais famosas do Estado, e o número de turistas nunca tinha sido problema, o objetivo dos organizadores era mudar de público. “A Pipa reclamava um turismo de conteúdo”, afirma Dácio Galvão, curador da Flipipa. A primeira edição teve 8 mil pessoas. Na última, em novembro do ano passado, o número de turistas trocando o sol pelas palestras subiu para 20 mil.

Quando organiza um festival, uma cidade busca também se tornar uma referência na área. É o que ocorre com São José do Rio Preto, em São Paulo. A cidade abriga teatro de vanguarda, musicais e peças clássicas. Em Campina Grande, na Paraíba, a ênfase é na música clássica. Seu diretor, Vladimir Silva, foi maestro em orquestras fora do país e atrai convidados internacionais consagrados. Ele já trouxe a pianista Eudóxia de Barros e o Quaternaglia Guitar Quartet, além de uma encenação da ópera contemporânea Domitila, de João Guilherme Ripper. Conhecida por ter a maior festa de São João do país, Campina Grande começa a se tornar referência em música erudita também. “Toda cidade deveria investir em cultura”, afirma Marcelo Lopes, diretor do maior festival de música erudita do Brasil, em Campos do Jordão, São Paulo. “O turista se identifica com a cidade, e o habitante se orgulha dela.”