A literatura também é pop


Foto: Rogério Vital

O auditório montado para a segunda edição do Festival Literário da Pipa terminou pequeno para o tamanho do interesse do público pelas palavras de João Ubaldo Ribeiro e Geraldo Carneiro. A cena já havia se repetido, com menor intensidade, em outros momentos: para o pós-modernismo de João Gilberto Noll e para o texto poético de Mia Couto, por exemplo. Mas foi na mesa da dupla João Ubaldo/Geraldo Carneiro que a comunhão entre público e escritores ficou completa. Um bom exemplo de mobilização da literatura. E a Flipipa 2010 esteve recheada de "bons exemplos".

No caso da mesa "Vida de escritor", onde João Ubaldo Ribeiro e Geraldo Carneiro falaram sobre suas trajetórias, foi o bom humor que encantou a platéia. Ao invés de simplesmente discursar, os dois apostaram na interação com o público. E deu certo. João Ubaldo Ribeiro avisou logo no início: "Prefiro que vocês façam as perguntas ao invés de eu ficar falando". A conversa seguiu sobre o início da amizade entre os dois escritores, a relevância dos prêmios literários, a influência da tecnologia, entre outros. "Os melhores são aqueles que têm prêmio em dinheiro. Qualquer escritor sincero responderia isso", arrematou João Ubaldo, arrancando aplausos e gargalhadas do público.

O romancista também brincou sobre o destino de um de seus Jabutis (a estatueta do prêmio homônimo) que acabou sumindo. Um dos primeiros autores a usar a ferramenta do computador para escrever suas histórias, Ubaldo disse que essa tecnologia mudou seu modo de trabalhar. "Antigamente, quando queria mudar um nome de uma personagem, desistia só pelo trabalho que teria para cortar a lauda, colar, arrancar o carbono", brincou o autor. Criterioso e apaixonado pela palavra, Ubaldo diz ter hoje pelo menos cinco ou seis versões de dicionários no seu computador e gasta mais horas fascinado pela palavra do que escrevendo. "Escrevo bem menos que antes quando tinha a máquina manual", disse.

Antes disso, o escritor João Gilberto Noll já havia protagonizado um momento de interação perfeita entre público e artista."Vou ler trechos de meus livros para que vocês conheçam um pouco da minha escrita", disse o escritor ao começar sua fala. O auditório fez silêncio. Noll falou principalmente sobre o processo de criação de sua literatura. Sob o olhar atento da platéia, o escritor confessou que encontra suas histórias na rua e gosta de caminhar para achar temas e personagens. Nesse último aspecto, ele disse se considerar muito mais um autor "de linguagem do que de personagens". "Meus textos parecem ser sempre sobre o mesmo cara", avalia.

Os temas locais também tiveram lugar no último dia de Feira Literária. Câmara Cascudo foi o tema escolhido pelos professores Durval Muniz, Vânia Gicco e Moacy Cirne. O foco foi a intensa celebração sobre o autor potiguar, mas sem um conhecimento de fato sobre a sua obra. "Cascudo é muito celebrado, mas pouco lido", resumiu Moacy Cirne. O desleixo da academia - um dos temas recorrentes este ano - e das editoras foi um ponto bastante abordado. Pouco antes, Yuno Silva, Laurita Arruda, Dirceu Simabucuru e o músico Carito discutiram a influência das novas mídias e das redes sociais sobre o jornalismo.

A participação do público, que se acomodou no chão para ver João Ubaldo Ribeiro e Geraldo Carneiro, teve destaque, não só no terceiro e último dia, como em todo o evento. Mia Couto, autor moçambicano que falou no primeiro dia de evento, foi um dos mais festejados, provocando filas tanto para a palestra como no momento dos autógrafos. Durante a fala, silêncio profundo para escutar o autor. Um silêncio de reverência.

* Fonte: Tribuna do Norte / Isaac Lira - repórter